Ação em rede transforma a perspectiva comunicacional





Há um novo perfil de comunicador para uma nova realidade de interação. As redes sociais e o múltiplo protagonismo exigem uma postura estratégica; sem, contudo, perder a ousadia de testar modelos e abordagens. Este foi o temário do 10º Encontro ABRP – Edição Comunicação Digital, realizado no dia 12 de setembro de 2009 no auditório da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado/FECAP em São Paulo/SP. Para debater as tecnologias, os processos e as ações e estratégias de relacionamento das organizações e seus públicos, foram convidados os profissionais e pesquisadores Beth Saad, Marcelo Coutinho, Carolina Terra, André de Abreu e Eduardo Vasques.

Transitamos entre a era industrial e a era da informação, onde a cultura de parcerias se transforma numa grande ação em rede. A contagem de inovações não se dá mais em gerações como antes, mas apenas em anos. Ainda assim, há convivência de diferentes consciências e práticas, que precisam ser integradas sem ser desrespeitadas. A relação com o meio digital se estabelece a partir da natureza do negócio, a cultura da organização, as características dos stakeholders e a própria visão de futuro e a direção dos investimentos dentro da clareza da relevância dos relacionamentos. O ingresso das organizações neste universo interativo pressupõe a contratação de equipes especializadas em tempo integral, numa ação qualitativa que gera necessidade de orçamento, ao contrário dos sistemas e plataformas que estão disponíveis gratuitamente. “É um processo operacional de trabalho para o que não estamos preparados, ainda mais em ambiente digital”, afirma a pesquisadora e professora da Escola de Comunicações e Artes da USP, Beth Saad.

Ela sugere a categorização dos públicos segundo seu uso e envolvimento emocional com a internet (espectador, novato, explorador, conector, profissional). A análise envolve três grandes temas: conteúdo, tecnologia e colaboração. No cardápio de usos do cenário 1.0 da rede constam ferramentas como e-mail, FAQ’s, enquetes, fale conosco, onde estão a maioria das organizações. No ambiente 2.0, entram novas tecnologias e interfaces amigáveis como blogs, microblogs, RSS, wiki, fóruns, processos de recomendação. E o mundo 3.0 está em construção, onde os sistemas de indexação vão ganhar importância. A dica da consultora é experimentar redes sociais para escutar e aprender a participar e compartilhar, preferencialmente com conteúdo de valor agregado que possa ser replicado nas redes de cada interagente. Neste sentido, é ver a comunicação contemporânea como organismo vivo, mutante, flexível e adaptável, podendo assim até antecipar tendências.

SOCIALCAST - Na internet, vê-se um novo padrão de comunicação, saindo do broadcast (um para muitos) e indo para o socialcast (milhares para milhares). Na perspectiva broadcast, a intenção é exposição da marca e os parâmetros de decisão estão embasados em alcance e eficiência. Já no socialcast, a base são fatos – gerados exatamente pelo encontro da comunicação organizacional e pela repercussão das pessoas, com outros tipos de parâmetros de mensuração. Este foi um dos princípios comentados pelo consultor de análise de mercado do IBOPE Inteligência e professor da Fundação Getúlio Vargas, Marcelo Coutinho. No início da rede, a visão predominante das empresas foi no sentido de aplicar o mesmo conceito de canal de difusão de informações para a internet, até surgir alguns espaços baseados eminentemente em interação contínua entre vários agentes, compreendendo que a mídia colaborativa funciona também como expressão e identidade social dos indivíduos. “No funil das decisões, o boca-a-boca é o ponto de diferença”, assinala.

O consultor mostrou vários exemplos, como o case “The Best Job in the World”, desenvolvido pelo estado australiano de Queensland, onde 19 pequenos anúncios em jornal incentivavam a acessar um website que divulgava o litoral australiano e propunha uma vaga de trabalho efetivo para ser o “zelador” de uma ilha. Cada candidato deveria enviar suas propostas por vídeo. O recrutamento inusitado, misturado com a fantasia de estar empregado num cenário paradisíaco, levou a seis milhões de visitantes no portal, sendo que 34 mil pessoas efetivamente criaram mais de 600 horas de vídeos. O retorno em mídia espontânea foi superior a US$ 120 milhões, levando para o mundo inteiro os atrativos turísticos da região através do buzz .

A internet instalou uma mudança significativa no esquema de influência de opinião, saindo da dinâmica de “dois passos” para o modelo de rede, em que a referência ultrapassa hierarquias e etapas e se intercruza de maneira instável. Ele destaca que “saímos do mundo de formadores de opinião para o conceito de correntes de opinião”, em que os princípios da troca de moeda do mercado econômico são alterados para os princípios de troca de atenção do mercado social. O Nielsen Global Online Consumer Survey 2009 indica que as recomendações de outras pessoas estão no topo da influência com 90% das citações, seguidas das opiniões de consumidores postadas online com 70%, websites corporativos com 70% e conteúdo editorial em jornal e revista com 69%. O Trust Barometer da consultoria Edelman aponta em último lugar de confiabilidade os conteúdos corporativos oficiais, sobremaneira a propaganda. “Mercados são conversações”, menciona para enfatizar que a recepção passiva de comunicação acabou, e a comunicação de marca deve ser um ponto-de-partida para o diálogo. Basicamente,o foco agora é aumentar o capital social, ou seja o prestígio entre uma rede de relacionamento, a partir da confiança, da comunicação e da capacidade técnica/expertise como atrativos para conseguir ampla colaboração. Os benefícios podem ser satisfação emocional (altruística ou competitiva), operacional (obtenção de conhecimento prático) ou financeiro (acesso a vantagens econômicas). Coutinho reitera que “é do cruzamento entre a comunicação e o consumidor que fatos são gerados como moeda de interação”.

A pesquisadora, relações públicas e diretora da área de Mídias Sociais da agência Ideal, Carolina Terra, assinala que as ferramentas não podem estar dissociadas do planejamento da comunicação integrada. RP funciona como meio de interação e transparência corporativa. Há uma mudança da tradicional pirâmide de influência para um paradigma mais fluido, colaborativo e digital. Citando Ji Lee, ela fala sobre a mudança no nível de intimidade da comunicação, que a partir das conversas pessoais diretas passou pelos chats, videochats, comunicadores instantâneos, perfis em redes sociais, chegando hoje aos blogs e microblogs, entre outros formatos de intermediação e potencialização, aumentando o escopo dos pontos de contato. A perspectiva é de engajamento e do uso de meios digitais para organizar as competências e as expectativas das pessoas neste propósito de aglutinar discussões e ações decorrentes. Carolina mostrou cases da Vivo, HTC, Google centrados na criação coletiva de conteúdo distribuído em redes sociais e na abertura ao diálogo, no enfoque do “relações públicas como um tradutor da complexidade de cenários com a ideia de envolver pessoas” e assim alterar o paradigma do controle da informação e criar uma cultura de colaboração.

O jornalista e mestrando da ECA/USP, André de Abreu, tomou para si a tarefa de tentar traduzir as mudanças no perfil do comunicador, sempre compartimentalizado em cursos e grades de disciplinas e portanto contraditório com o exercício transdisciplinar do trabalho. Para ele, “a sociedade demanda relacionamento e interação das empresas e agências, e não há profissionais para problemas complexos, porque eles não se resolvem com soluções isoladas”. São várias competências entremeadas como administração para fazer planos de negócios, jornalismo para embasar a produção de conteúdo, marketing para pensar estratégias de posicionamento, sociologia para compreender as influências entre pessoas. Já Eduardo Vasques, redator da agência de relações públicas do Grupo TV1 e coordenador do GT Relações Públicas Digitais da ABRACOM, refletiu que viver em sociedade é possuir vínculos diversos por interesses específicos, independente das redes digitais. Todavia, o avanço da tecnologia trouxe outras conexões ao formato antes exclusivamente presencial, potencializando o alcance dos diálogos e impressões sobre o mundo e sobre as marcas. Os laços são considerados fracos, muitas vezes, por uma falta de profundidade, mas tomam conta de novos hubs informativos. Para além das evidentes mutações comportamentais e inovações técnicas, a necessidade da comunicação não se perde, seja pela manutenção de contatos e afetos ou pela vontade de gerar relações de negócio. “Independente da plataforma, trabalhar em redes sociais é cuidar da reputação”, enfatiza ele. Os pilares da comunicação agora são a comunicação contínua, o conteúdo relevante, a agilidade de resposta e a aderência à linguagem dos canais. Vasques repassou uma série de cases positivos e negativos nas rede sociais para exemplificar seus conceitos.

O programa Encontro ABRP faz dos eventos um espaço de diálogo entre estudantes, profissionais do mercado e acadêmicos, para o debate das melhores práticas, tendências e discussões de assuntos que pautam a realidade e os desafios da dinâmica do campo da Comunicação, sempre aos sábados em uma universidade que mantenha curso de Comunicação Social na capital paulista. Vários temas já foram tratados, como gestão de crises, governança corporativa, mensuração de resultados e comunicação pública e governamental. Informações sobre os próximos encontros, basta recorrer a http://abrpsp.wordpress.com/ ou ainda abrpsp@abrpsp.org.br . A entidade faz a divulgação de resultados e entrega de prêmios da 27ª edição do Prêmio ABRP – Destacando Talentos em Relações Públicas no dia 28 de outubro de 2009, em cerimônia no auditório da UniSant’anna, apontando as melhores monografias, trabalhos de conclusão de curso e projetos experimentais de relações públicas em graduação e pós-graduação do país.


RP Rodrigo Cogo – Conrerp SP/PR 3674
Gerenciador do portal Mundo das Relações Públicas (http://www.mundorp.com.br/)

This entry was posted on domingo, 20 de setembro de 2009 and is filed under . You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. You can leave a response.

One Response to “Ação em rede transforma a perspectiva comunicacional”

Carol Terra disse...

O debate foi muito interessante e pudemos discutir questões latentes em comunicação organizacional digital. Abraços, Carol Terra (http://rpalavreando.blogspot.com)