Era digital forma outra face da comunicação

Um único evento que ofereça seis conferências internacionais e duas nacionais, uma entrega de prêmio, 28 palestras temáticas simultâneas, 10 workshops e uma feira expositora é um imenso desafio. E para todos. Afinal, um menu tão diversificado de opções às vezes leva o participante a uma permanente sensação de estar perdendo alguma parte, além de exigir um ajuste fino na equipe organizadora para etapas tão cronometradas. O 11. Congresso Brasileiro de Comunicação Corporativa (www.megabrasil.com/congresso11), promovido pela Mega Brasil Comunicação (http://www.megabrasil.com.br/) entre os dias 14 e 16 de maio de 2008 no Centro de Convenções Rebouças em São Paulo/SP, com o tema central “A Era Digital e a nova face da Comunicação”, saiu com saldo positivo confirmado em pesquisa junto aos mais de 700 inscritos: assuntos, palestrantes, caráter inovador e outros quesitos foram muito bem avaliados em percentuais acima de 70%. Para além de qualquer unanimidade, o que interessa mesmo é a aprendizagem teórica e a aplicabilidade, então o esforço de reportar tamanha carga informativa começa aqui.


A desconfiança pública nas ações institucionais em geral e o aumento na expectativa das pessoas frente à intervenção privada nos problemas sociais configuram a realidade sobre a qual as organizações e seus comunicadores precisam trabalhar. Com a experiência de estar num grupo presente em 34 países com 97 mil funcionários, a presidente da Fundação Alcoa, Meg McDonald, deu partida ao congresso tratando das empresas e comunidades em um compromisso pelo crescimento sustentável. No setor de negócio da empresa, ela diz que tudo parte da excelência ambiental (redução de emissões, tratamento de resíduos) para só depois se pensar em execução de projetos. A construção da confiança acontece por meio da confirmação de atuação responsável em três frentes: comunidade (de entorno, grupos sociais de pressão, universidades, investidores), sociedade e funcionários e parceiros. Estes últimos são considerados “embaixadores” da empresa. “Ö engajamento da equipe é a parte crítica da jornada de sustentabilidade”, assinala.



Já foram US$ 14 milhões aplicados desde 2001 em 28 países, sendo R$ 85 milhões investidos em mais de 1500 ações no Brasil. Meg aponta que a participação das gerências locais, com íntima e ativa relação comunitária, é a base da gestão da interface externa, e não com porta-vozes institucionais que não mantém contato cotidiano com as comunidades. Outro trunfo descoberto pela empresa é o voluntariado, em que equipes de cinco ou mais funcionários envolvem-se em entidades durante meio turno e a empresa investe US$ 3 mil no projeto escolhido. A noção de comunidade de interesse não é mais regulada pela proximidade física, porque as redes sociais trouxeram uma nova conformação. Através delas se vê que a complexidade das expectativas tem aumentado, porque as partes interessadas mudam sob vários prismas e com maior freqüência, sendo imprescindível detectar essas alterações culturais, econômicas e relacionais.



Cada proposição de aumento de planta industrial acontece por meio de oficinas de integração com as cidades, havendo ainda um foco maior e uma imersão na fábrica para líderes de opinião. A idéia, segundo a executiva, é mostrar como o desenvolvimento da empresa é um catalizador para o crescimento de todos, com esclarecimentos em um espaço de diálogo institucionalizado e relevante. Há, a partir disto, a formação de um comitê sustentável com representantes da iniciativa privada e do Poder Público impactados com a obra e a operação futura. “Ainda assim, não podemos nos centrar somente em regras, mas sim nos basear num conjunto de princípios e valores que norteia e organiza as ações de todos a partir da empresa”, destaca. Por isto, a empresa não conta somente com profissionais de Relações Públicas e de relações corporativas para executar a interface com os públicos. Esta é uma função compartilhada.



REDES SOCIAIS – Oportunidades e ameaças estão no caminho das empresas nas redes sociais. Alan Oshiki, diretor geral da agência Brodgate de New York, procurou enumerar cada parte. As redes apresentam características fortes, como o imediatismo, a fragmentação e a contribuição coletiva na geração de conhecimento. Daí que se percebe a impossibilidade de controle editorial e se compreende sua alta repercussão. “Elas permitem feedback imediato aos erros de marketing e também agregam propaganda adicional e gratuita. Não subestimem o poder das redes sociais, as insiram em seus planejamentos de comunicação”, alerta.



Só o monitoramento destes canais não é suficiente na opinião do empresário, porque o mais importante seria antecipar ameaças que causem comentários e movimentos contrários e questionadores. Além disto, não se sabe qual plataforma será relevante e duradoura para cada empresa, o que poderia facilitar abordagens, e a efemeridade prevalece.



FERRAMENTAS – Décio Manso, da BoxNet, deixou a platéia perplexa e silenciosa. Apesar dos serviços da empresa, integrante do grupo Maxpress, já estarem sendo oferecidos há relativo tempo, parece que muitos comunicadores não estão integrados com as ferramentas de gestão do conhecimento. Sua palestra sobre planejamento, organização e gestão de presença na mídia esteve centrada na administração competente de informação que subsidia a tomada de decisões, com aumento de sensibilidade e de percepção sobre o ambiente a partir de dados que clarificam as tensões e as tendências. Tudo parte do mesmo ciclo: monitoramento, gestão (transformação da matéria-prima em informação), conhecimento e decisão.



A vigilância de dados em determinados espaços e canais sobre certo conteúdo num dado espaço de tempo promove um amplo levantamento. São marcas (nomes de pessoas, de empresas), temas, personagens (articulistas, jornalistas, produtores de conteúdo), produtos, legislação, concorrentes, obtidos por cidade, percentual populacional, países e idiomas, em tempo real, periódico ou em horários predeterminados por conteúdo e mídia, afora uma série de outros cruzamentos. “Mas a riqueza da inteligência é transformar informação em conhecimento, convertendo conteúdos coletados em algo utilizável com valor agregado”, orienta.



Aí entra também a indexação para permitir rápida pesquisa e interconexão. Na área pública, Manso exemplifica o caso de eleição para governador em que atingiu o requinte de dividir dados por análise (ataque, comentário, elogio, promessa) e por fonte (citação, entrevista, matéria), além de outras divisões mais corriqueiras como veículos e região. Quando o político eleito solicitou um apanhado de promessas feitas, este conteúdo foi entregue algumas horas depois em DVD separando vídeos, áudios e clippings digitalizados, ainda setorizados por assunto (cultura, saúde, segurança, educação e outros). Até mesmo ondas de repetição de cobertura são monitoradas, quando fatos sazonais podem repetir-se e novamente movimentar a mídia (racionamento de água e luz no verão, doenças respiratórias no inverno), sendo que relatórios de comportamento e estilo de matérias por veículo e jornalista do ano anterior são entregues para tomada de precauções e fornecimento de dados. “É um modelo que pretende canalizar as informações de interesse dos gestores, com a percepção correta dos cenários para chegar nas decisões mais precisas”, finaliza.



Web traz novas oportunidades e faz exigências


Se são 120 mil novos blogs por dia no mundo, com uma audiência brasileira de 9 milhões de pessoas, está mais que na hora das empresas entenderem este novo canal. Os internautas, por conta da previsão de haver dois bilhões de PCs em funcionamento até 2015, vão ultrapassar muito as atuais 1.300 páginas visualizadas por mês para cada um. Além disto, há as redes sociais, que enfrentam um alto amadurecimento – confirmado pelo índice de 80% de usuários com até 150 amigos, numa seleção e manutenção somente dos relacionamentos mais produtivos – onde as recomendações de outros consumidores e opiniões disponíveis on-line, conforme pesquisa da Forrester Research, pesam muito mais nas decisões de compra do que os discursos de meios tradicionais de comunicação. Aliás, 10 serviços deste gênero concentram 86,6% do boca-a-boca on-line. Este foi o panorama traçado por Patrícia Gil e Luis Henrique Amaral, da agência Máquina Web, durante palestra no 11.Congresso Brasileiro de Comunicação Corporativa realizado pela Mega Brasil Comunicação nos dias 14 a 16 de maio de 2008, para exemplificar o “groundswell”, movimento de massa da web 2.0 que evidencia a satisfação das necessidades via outras pessoas e não por meio de instituições formais.



Eles sugerem seguir a sigla POST : People (aproxime-se dos públicos), Objectives (defina o que deseja), Strategy (planeje seus passos) e Technology (escolha ferramentas ideais). Neste sentido, apesar da importância de entender as novidades da telemática, não titubeiam em opinar: “concentrem-se nos relacionamentos, não em tecnologia”. Entre os cinco objetivos para perseguir na web, que devem estar conectados com a cultura de cada organização, estão: ouvir pra entender os públicos; falar para reforçar informações sobre a empresa; potencializar para fomentar o boca-a-boca positivo; apoiar para colaborar com públicos e consumidores; e integrar para incluir públicos na gestão do negócio. Neste caminho, entre os serviços requisitados, estariam a gestão de presença na web, a formação de evangelistas da marca, os blogs corporativos, o diagnóstico de imagem e os termômetros-web (monitoramentos), o que significa sair do planejamento, produção e gerenciamento de sites, hotsites, intranets ou enews que fazem parte da web 1.0 .


Patrícia aponta os tipos de internautas já identificados: 18% são criadores de conteúdo, 25% são analistas críticos sobre os conteúdos circulantes, 12% são colecionadores (de amigos, de fotos, de vídeos, de áudios, de RSS), sendo que os maiores percentuais são de espectadores (48%) ou de completamente inativos (44%). O segredo é identificar quem são os influenciadores de opinião (por relevância, popularidade, potencial de repercussão), monitorar os conteúdos, fazer comunicação peer-to-peer (transparência e linguagem horizontal) e gestão de relacionamentos web. Segundo dados da RapDigital, relativos a março de 2007, apenas 5,5% das empresas desenvolvem ações de relacionamento com clientes e campanhas por redes sociais, o que demonstra o grande espaço, até porque 51% das empresas globais nos EUA e Europa já definiram orçamento específico para ações de RP na web para 2008. Enquanto as agências não ocupam o lugar, outros públicos fazem o serviço: 44% das companhias com blogs têm conteúdo gerado pelos próprios funcionários.



INTERNACIONAL – A experiência de trabalho em 28 países, com 1.600 restaurantes movimentados por 75 mil funcionários e 3,5 milhões de clientes por dia, na parte latina do McDonald’s, foi tratada pelo sócio da Publicom Aldo de Luca. A idéia era mostrar na prática como se dá uma comunicação internacional em vários idiomas. A ferramenta McToday, um programa on-line que mostra agenda de eventos corporativos, notícias relacionadas com sinopse, resultados gráficos de publicação diária de releases e chat, dá o tom de como as equipes de 40 agências integradas pautam e unificam o trabalho sem desrespeitar as peculiaridades locais. Também digital, ainda que possua uma versão impressa, está o Guia de Satisfação de Clientes e Gerenciamento de Situações Especiais para prevenir ou administrar crises nos pontos. “Em geral, o gerente é o SAC de cada restaurante, o que não for resolvido é centralizado e gerenciado via site”, explica, tanto que a área de atendimento ao cliente é ligada ao segmento de gestão de riscos.


O website da empresa vem sendo posto em três idiomas da região de abrangência (português, espanhol e francês), e daí Luca aproveita para dar a dica: o domínio do espanhol é um ponto de referência no mercado atual, o que também explica o motivo dos vídeos mostrados estarem em tal língua. Na comunicação interna, ele ainda fala do chat com o Presidente, uma livre conversação com os funcionários, e do boletim McValor distribuído para mais de 300 empresários franqueados. Em tudo, há o cuidado extremo com tradução de materiais, buscando sempre a revisão por um nativo – inclusive na diversidade dentro da língua espanhola no continente – porque isto afetaria a sensação de constituir uma empresa efetivamente local.


O programa “Voice of McDonald’s” e o quiz “Na Ponta da Língua” receberam atenção na palestra. O primeiro é uma ferramenta de motivação e integração em que funcionários fazem vídeos cantando e postam numa rede social interna, com escolha dos melhores em show específico – presença de Rod Stewart no ano passado - e premiação. Já o segundo e um jogo de temas atuais e relevantes, em voga na mídia, com premiação das melhores respostas, na intenção de propor o interesse e conhecimento de assuntos correntes tratados pelos clientes em sua permanência nas lojas. Os projetos McDia Feliz, Instituto e Casa Ronald McDonald’s também foram lembrados como casos de filantropia em rede. Um esforço agora do grupo é estruturar restaurantes ecológicos, com coleta seletiva, materiais recicláveis e uso de biodiesel (coleta na cozinha e utilização na frota própria e de fornecedores).
Comunicador deve estimular conversações


Ambientes mutáveis e dinâmicos requerem desenvolvimento de novos processos em estrutura, tecnologia e recursos humanos, trazendo à tona a relevância e a premência de organizações mais flexíveis. Este foi o ponto-de-partida da professora, pós-doutora em Cultura Organizacional e relações públicas Marlene Marchiori, durante sua palestra no 11.Congresso Brasileiro de Comunicação Corporativa realizado pela Mega Brasil.


Por isto, seria preciso para os comunicadores aproximarem-se das teorias administrativas, para poderem perceber a visão mecanicista muito presente, através da hierarquização, burocracia e formalidade, focada em canais e instrumentos. O que se deveria enfatizar hoje, segundo a pesquisadora, são as organizações orgânicas, com redefinição constante de tarefas onde organogramas têm pouca utilidade, enfatizando de outro lado os sistemas sociais e as pessoas com importância para a interpretação de mensagens e geração de significados. Ambas as perspectivas podem estar presentes na organização contemporânea, mas se reconhece a prioridade da visão orgânica por considerar aspectos de atitudes, conhecimento, situação social e cultura dos agentes em conversação, como emissores e receptores alternados.


Marlene destaca que a organização só seria possível por meio da comunicação, não sendo essa apenas mais um elemento para gerenciar ou um mecanismo de melhorar desempenhos e metas por meio de táticas e veículos na linha “management-oriented”. A comunicação cria cultura organizacional, gerando significados pela interação. E complementa: “a comunicação interna numa perspectiva funcionalista é viável e até necessária, mas precisamos de outros olhares que não sejam tão lineares, no caminho de uma comunicação mais humana, mais participativa. É a comunicação colaborativa como meio de se chegar a um posicionamento do coletivo”.


Sua visão de pós-modernidade interveniente neste processo traz a flexibilidade e a diferença, em que a linguagem e a negociação social de significado assumem posição fundamental. É um processo democrático, emergente e baseado no consenso com empowerment dos funcionários. Daí derivam os desafios organizacionais, onde seria preciso transformar informação em conhecimento com a expectativa das equipes em produzir resultados significativos em seus trabalhos. Mostrando indicadores de pesquisa da ABERJE, ela detecta que a comunicação vem sendo tratada como produto, como publicação, como comunicadora de fatos ocorridos. O que se postula é o estímulo ao diálogo a ponto de construir uma nova realidade, uma nova organização.


O Gallup Management relaciona três tipos de empregados: engajados, não-engajados e ativamente desengajados, trazendo a relevância da gerência média e supervisores no bem-estar e na satisfação das equipes por meio da comunicação interpessoal. Cerca de US$ 355 bilhões é o custo do desengajamento, que interfere na produtividade e na qualidade dos produtos e serviços. Os funcionários estão confusos em relação a seus papéis: para 84% o fluxo de informações não flui livremente, e a saúde organizacional (a competência de transformar planos em ações e resultados) é precária. Dentro disto, Marlene aposta num caminho de melhor entendimento da organização como um todo em que atividades com sentido sejam desenvolvidas e divulgadas, com fortalecimento das lideranças. “Só assim se conquista credibilidade e legitimidade. Os espaços organizacionais são marcados por relacionamentos de poder, de conhecimento e de discurso. Com este entendimento, se pode falar em sustentabilidade dos empreendimentos”, indica.


ECOSSISTEMA – O publicitário Luis Lara, presidente da agência de propaganda Lew’Lara/TBWA, afastou-se das apresentações recheadas de rolos de filmes impactantes, típicas do meio, para demonstrar uma nova visão conceitual no encerramento do primeiro dia do Congresso. Como marca é um instrumento de construção de cultura, e não mais simplesmente de imagem, ele aponta ser importante perceber que a comunicação conforma a identidade da marca. No atual ecossistema, as estruturas são horizontalizadas e compartilhadas, onde o conceito é bem além do logo e da proposição mercadológica convencional, sendo isto sim o ser e fazer da organização. “O desafio é fazer uma imersão na cultura da empresa, entendendo sua missão, valores e atributos, conhecendo o pensamento sistêmico, de onde a identidade da marca é construída”, sugere.


Toda a empresa precisa estabelecer gestão da marca a partir do gerenciamento da relação com stakeholders e dos conflitos inerentes. O posicionamento e a conexão da marca com os públicos precisam conformar experiências únicas para serem efetivos e duradouros. É um caminho cheio de obstáculos numa sociedade digital em que todos são sujeitos e influenciadores. Lara alerta que “na era digital, o consumidor está todo o tempo conferindo os discursos. E precisamos cuidar porque nós não vemos as coisas como elas são, nós as vemos como nós somos”.


O projeto Mulher Real, do Banco Real, foi apontado como um bom exemplo destes novos tempos. Ele trata dos diversos papéis da mulher contemporânea, a partir de um site convocando a contar histórias nesta conciliação. Foram três mil participações e as melhores foram contadas no programa Saia Justo, do canal pago GNT, e hoje estão baseando propagandas da instituição. “É uma grande ação de relacionamento, antes de ser negócio”. Outro caso seria do projeto Amor pelos Cães da Pedigree, desencadeado por uma série de ações presenciais com os cães e seus donos em espaços públicos, e também a partir dos criadores existentes na própria indústria no Dia dos Animais, em que os pets são levados para o ambiente de trabalho para emergir a emoção necessária para compreender o universo do negócio. E aí sim oferecer produtos ou serviços adequados, personalizados e portanto desejáveis e depois recomendáveis.



Perguntado sobre como encaminhar-se para esta linha de raciocínio e de criação comunicativa, Lara não hesita: “olhe para o lado, porque a comunicação não precisa saber tudo, mas sim estimular respostas. Agora é o momento de saber fazer perguntas”.


RP Rodrigo Cogo – Conrerp SP/PR 3674
Gerenciador do portal Mundo das Relações Públicas (http://www.mundorp.com.br/)

This entry was posted on domingo, 25 de maio de 2008 and is filed under ,. You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. You can leave a response.